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terça-feira, 18 de setembro de 2012

TRISTEZA

Estou triste.
Sufoco com um nó no peito que me aperta.
Dou por mim a fazer beicinho, como quando era criança.
O medo paralisa-me e passei o dia quase todo enroscada em cima da minha cama.
Em intervalos irregulares, a emoção aflora, e as lágrimas caem quentes para cima da minha almofada.
Levanto-me apenas para as tarefas essenciais à nossa sobrevivência. 
Passear as cadelas, ir à mercearia, tratar do jantar...
Sustenho a respiração, sempre que o meu filho se aproxima.
Não quero que me faça perguntas porque se fizer, eu sei que vou desmoronar.
Ha já muito que eu sabia que este tempo ia chegar.
Que ia ter de fazer escolhas, tomar decisões...
Que talvez tivesse que mudar tudo outra vez.
Que tivesse que deixar esta casa, esta cidade e este mar.
Mas resolvi aproveitar cada dia, cada momento, cada pequeno segundo.
Partilhei tudo, com todos os que pude, que amo, e que me querem bem.
Enchi esta casa de amor, de risos, alegrias, musica e dança.
E agora que o tempo urge e a pressão aperta, eu sinto na pele o retorno de amar tanto assim.
Porque eu sou amiga da nespereira do quintal das traseiras da janela do meu quarto.
Sou amiga dos pardalinhos que me acordam a cantar todas as manhãs,  a quem  atiro pão para cima telhado da cozinha em sinal de gratidão
Tornei-me intima desta longa extensão de areia, onde passeio todos os dias as minhas meninas.
Deste mar maravilhoso onde deposito as minhas lágrimas e os meus risos.
Conheço todos os animais da cidade, e graças a eles, os seus donos também...
Comovi-me vezes sem conta com este senhor estrangeiro que tem uma agência de viagens mesmo em frente à janela da sala.
Ele nem sonha o que já chorei por ele, por ver o desespero espelhado nos seus olhos verdes cheios de água, os suspiros e as mãos na cabeça de quem tudo investiu num negocio que já não da frutos.
E que quando me mudei para cá, há cerca de dois anos, me encontrava exactamente na mesma situação.
  Que eu tinha acabado de abrir mão do meu sonho, enquanto o via agarrar-se com todas as forças a este pedaço de madeira, qual náufrago sem rumo, à espera de ver terra firme...
Trocamos sempre um "bom dia", "boa tarde" e "boa noite", porque ele chega antes de eu acordar, e parte quando a lua já vai alta.
Há dias em que olha para mim como se eu o pudesse salvar, sem imaginar o quanto eu gostaria, não fosse eu também um pedaço de madeira , e com a voz trémula grita baixinho: "Hoje nem um EURO! nem um mapa consegui vender..."
Ao qual eu sempre respondo com o meu sorriso mais doce, apressando o passo, para que ele não veja a tristeza que me vai na alma:"Vai ver que amanhã vai correr melhor..." 
Outros em que o observo ao longe a caminhar pela praia, de sandálias na mão e calças arregaçadas, parando para molhar as pernas até aos joelhos, olhando o horizonte, num nítido pedido de auxilio ao criador.
Eu sei, porque faço o mesmo.Eu sei...
E pergunto-me, o que será deste senhor quando eu não estiver aqui para lhe desejar boa noite, em silêncio, enquanto retira o cadeado da bicicleta, para ir enfim descansar após mais um dia de sufoco.
 Quem irá alimentar os pardalinhos, dar os bons dias à nespereira,levar biscoitos ao Hércules, o cão do senhor que vende cinzeiros feitos de latas, mesmo junto às escadas rolantes?
E para dificultar ainda mais esta minha inútil tentativa de fuga à tristeza, nestes últimos dias, a praia não tem parado de me oferecer pedras em forma de corações perfeitos, búzios maravilhosos, e a visita de um dos meus pardalinhos, que no outro dia bem cedo de manhã me acordou com o bater das asas,  pousou em cima da minha cama, olhou bem fundo nos meus olhos, e só depois regressou para perto da família.Assustei-o.
Porque  dei um grito de alegria, como só a criança que me habita sabe dar!
 Era de alegria...Não foi para te assustar...
Eu queria tanto ter conseguido ficar muda e tentar tocar-lhe...
Eu sei que ele teria deixado.
Como naquele dia do verão passado em que fui a primeira pessoa a avistar algo na água que se aproximava a grande velocidade da margem. 
Parecia um tubarão mas eu nem hesitei, e precipitei-me ao encontro daquele ser magnifico.
Mas quando ele já me tocava nos joelhos e eu percebi que estava em sofrimento, corri para a toalha para ligar às emergências.
Pedi que enviassem a policia marítima, com a máxima urgência, porque um golfinho estava a morrer na praia. 
O meu grito de criança soltou-se de novo, desta vez de aflição, e quando corri para o mar, cheia de coragem para tocar aquele tesouro, já ele havia voltado para o mar.
Será que o mar lhe disse, que eu também o queria salvar?
Que não fugi, e que teria dado tudo para o poder tocar?
Soube no dia seguinte que o meu golfinho, era afinal uma baleia bebé que tinha sido encontrado morta, algumas praias à frente.
Corri para o meu caderno dos segredos e de olhos lavados em lágrimas  agradeci mil vezes pelo milagre que pude ver, e que talvez um dia, Deus me  deixe tocar.
Esta noite, irei fazer o que sempre faço antes de dormir.
Olhar as estrelas e a lua, enviar beijos aos pardais, dizer boa noite à nespereira, e pedir outra vez ao céu que me ajude a ver a porta que se abre, enquanto a tristeza vai fechando devagar, aquela que eu não quero largar...

Cláudia.




4 comentários:

Amaral disse...

Eu sei que mudar significa renascer. Que só mudando podem acontecer coisas novas. Mas deixarmos alguma coisa que se ama... faz doer!... Toda a gente já passou pela experiência... toda a gente sabe que pode voltar a sucerder... e sabemos como dói!...
Quando a vida nos obriga a fazer escolhas... sabemos, também, que alguma coisa está preparada para acontecer e a nossa realidade está prestes a sofrer alguma alteração.
Mas nós sabemos, e tu sabes muito melhor do que eu, que quando uma porta se fechas, abrem-se de imediato uma ou mais janelas.
Tudo passa a ter outro sentido... e o amor redobra-se para se espraiar por novas experiências.
É sempre assim: o ser humano tem este dom de se adaptar a todas as circunstâncias. E as emoções tomam conta de nós e dizem-nos que a Vida está sempre connosco, que a Força está impregnada de Amor, que tudo está bem... quer seja nesta casa, nesta cidade, noutra casa ou noutro mar...

Cláudia disse...

P/Amaral-Faz doer sim, amigo, faz parte da circunferência que é o amor.
Eu acredito que essas janelas se vão mostrar em breve, e também que tudo o que vier será o melhor para mim.Tudo está bem, tudo vai ficar bem.Eu acredito que a vida vai tomar conta de mim,e que em breve irei saber para onde levar o barco...Grande beijinho e obrigada pela tua força!

Anónimo disse...

Meu amor,
Quem me dera poder dizer-te que sim, que não saias desse cantinho que tão bem conheces e que te oferece tanto!
O que mais entristece, é saber que o dinheiro é o motor que permite ou impede de realizar um sonho.
Meu bébé, se eu pudesse, podes crer que faria tudo para te ver sorrir sempre...
Tua mãe que te ama

Cláudia disse...

Mãe, acordei lavada em lágrimas ao receber o amor que deixaste aqui. Lágrimas de gratidão, sobretudo.Por seres tão linda, tão preciosa e tão minha... Tu sempre fizeste tudo para me fazer sorrir, e eu não conheço sorriso mais bonito do que o teu.
Obrigada por este colo imenso, sempre disponível para me acolher...
Amo-te, amo-te amo-te...